
Embora quem quase morreu esteja vivo, quem quase vive já morreu. (Luiz Fernando Veríssimo)
O ser humano padece no corpo as feridas de um sofrimento existencial. Ao mesmo tempo, sofre na existência as vicissitudes próprias do fato de ter um corpo: A enfermidade, o acidente, a decadência. (Martoccia & Gutiérrez)
Sigmund Freud. Câncer na boca, provocado seguramente pelos inúmeros charutos que fumava. Foi submetido a 33 operações, numa escalada infernal de dor e desconforto que suportou com extraordinário autocontrole. Pai da Psicanálise.
Charles Darwin. Doença de Chagas, mal estar constante, fraqueza, sensação de desmaio e morte, insônia, dores de cabeça, espasmos, tremores e convulsões musculares, incoordenação motora, calafrios, vertigens e tonturas, manchas negras e estrelas diante dos olhos, taquicardia, poliúria (urina abundante e de cor pálida), ataques violentos de náusea, vômitos freqüentes (em alguns casos se prolongando por dias ou semanas), flatulência noturna, acompanhada de zumbidos nos ouvidos, crises súbitas de eczema que cobriam toda sua cabeça, inchaços em várias partes do corpo e bolhas na pele que arrebentavam, crises de depressão, forte ansiedade, choro histérico e abatimento geral, que o colocavam de cama às vezes por meses a fio. Fundador da Teoria da Evolução.
Magdalena Carmen Frieda Kahlo Calderón (Frida Kalo). Poliomielite contraída aos seis anos, sendo esta a primeira de uma série de doenças, acidentes, lesões e operações que sofre ao longo de sua vida. Sua perna direita ficou muito magra e o pé esquerdo atrofiado, causando deformidades permanentes. Uma intensa vida de sofrimentos, tratamentos médicos cirúrgicos e fisioterápicos, passando pela mutilação da amputação de dedos e depois do próprio pé, difícil convivência amorosa com um complicado marido. Pintora mexicana de notoriedade mundial.
Vincent Van Gogh. Psicose maníaco-depressiva (distúrbio bipolar do humor). 150 psiquiatras examinaram Van Gogh, e 30 diagnósticos diferentes foram dados, entre eles: esquizofrenia, sífilis, epilepsia, porfiria aguda agravados por insônia, má nutrição, ingestão de álcool (absinto principalmente). Maior expoente do pós-impressionismo.
Antônio Francisco Lisboa (Aleijadinho). Doença de Hansen, reumatismo deformante e porfiria, esculpia mesmo com as mãos amarradas nos martelos, até a avançada idade de 82 anos e somente parando de trabalhar devido à cegueira que o acometeu. Maior escultor barroco, símbolo da Arte Sacra de Minas Gerais e do Brasil perante o mundo.
Ludwig Van Beethoven. Foi-lhe diagnosticada, aos 26 anos de vida, a congestão dos centros auditivos internos. Desesperado, entrou em profunda crise depressiva e pensou suicidar-se. A doença continuou a progredir e, aos 46 anos de idade, estava praticamente surdo. Um dos compositores mais respeitados e mais influentes de todos os tempos.
Stephen William Hawking. Esclerose lateral amiotrófica (rara doença degenerativa que paralisa os músculos do corpo sem, no entanto, atingir as funções cerebrais, não possui cura). Utiliza um sintetizador de voz para se comunicar. Gradualmente, foi perdendo o movimento dos seus braços e pernas, assim como do resto da musculatura voluntária, incluindo a força para manter a cabeça erguida, de modo que sua mobilidade é praticamente nula. Um dos mais consagrados físicos teóricos do mundo.
Sempre que penso nisso, é como se minha mente desse um nó. Confesso que me sinto um tanto pequena, fraca. O que eu fiz? Em que contribuí? O que me difere dos outros mortais em meio à multidão? Mas isso é mais em um primeiro momento, porque depois.. Ah! Depois eu páro e contemplo! PORQUE O SER HUMANO É IMPRESSIONANTE! E todas as feridas não são capazes de apagar esse fulgor, esse brilho.
Existe sempre o momento, em qualquer situação, onde você pára e decide: O que eu faço agora? Os meus ossos não me sustentam, os meus ouvidos já não ouvem, a dor me corrói, as feridas não cicatrizam, as esperanças estão a um fio, o dinheiro acabou e tudo que me resta é o desespero que me abate. Mas e então? Em que instante essa sede pela vida interfere e proporciona o bálsamo que te faz resistir? De onde vem essa força?
Freud chama de 'pulsão de vida' tudo aquilo capaz de mobilizar a energia humana para a criação, expansão e manutenção da vida. Em contra partida, a 'pulsão de morte' expressaria uma tendência para o retorno à imobilidade (auto-limitação de vida). Se existe uma pulsão de vida e uma de morte, é sinal de que existe uma escolha. E se existe a possibilidade, o que faz com que o homem escolha viver? Não simplesmente viver, porque qualquer um faz. Eu falo de VIVER! Estado de atividade, comportamento, criação, movimento, calor, animação. Eu falo de algo além..
Falo de um homem que, embora devastado pela dor, supunha que quando tudo ia bem demais em sua vida, o texto não saia bom. Falo de um homem que, padecendo de males físicos e psíquicos, fundou a uma teoria sobre a qual o mundo inteiro se debruça. Falo de uma mulher cuja vida recheada de tragédias e dramas, foi o principal ponto de partida de sua obra, inspirando-a e marcando-a de forma incontornável. Falo de um homem cuja sanidade não foi poupada, mas que “queria a luz que vem de dentro, queria as cores que representassem as emoções, que procurava com o vermelho e o verde exprimir as mais terríveis paixões humanas". Falo também de um homem que não se importou em esculpir com as ferramentas amarradas à sua mão. Falo de um homem que, embora praticamente surdo, deixou-nos as grandes obras sinfônicas que são a culminância da música. Falo de um homem cuja doença lhe roubou todos os movimentos, mas não foi capaz de lhe roubar o brilhantismo.
Eu me refiro às inúmeras pessoas, famosas ou não, lembradas ou não, admiradas ou não, que foram mais fortes que as duras penas que a vida pode acarretar. São eles os verdadeiros gênios, cuja vida foi sua notoriedade, o seu baluarte.. O seu troféu.
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